O presente ensaio discute os desafios e responsabilidades que os africanos enfrentam no século XXI na implementação da democracia constitucional que pelo seu modelo contrasta com as culturas pré-existentes, os processos eleitorais que legitimam a governação que em parte são manipulados por factores endógenos e exógenos para a consagração dos vencedores, os níveis de participação inclusiva que incluam todas as camadas sociais e o papel da sociedade civil que não só é grupo de pressão assim como monitora as actividades governativas dos dirigentes e também discute a distribuição equitativa da riqueza e as vantagens que a África deve tirar no contexto da globalização.
Palavras-chave: Democracia Constitucional, Legitimidade, Poder, Sociedade Civil.
This essay discusses the challenges and responsibilities that Africans face in the 21st century in the implementation of constitutional democracy that by your model contrasts with the pre-existing cultures, the electoral processes that legitimize governance which are handled by endogenous and exogenous factors for the consecration of the winners the levels of inclusive participation involving all social strata and the role of civil society that is not only pressure group and monitors the activities of government leaders and also discusses the equitable distribution of wealth and the benefits that Africa must take in the context of globalization.
Keywords: Constitutional Democracy, Legitimacy, Power, Civil Society.
O aprofundamento da democracia constitucional e a respectiva legitimidade em África, só pode se assegurada com consolidação da ordem política constitucional dentro dos países membros, como condição para a promoção de um desenvolvimento sustentável e de uma sociedade pacífica e estável conforme recomendam os objectivos da NEPAD. São encaradas diversas dificuldades no processo de implementação dos sistemas de governação democrática na maioria dos países africanos, devido ao desrespeito dos direitos humanos, marginalização das populações desfavorecidas (ROQUE, 2010, p.35).
O posicionamento desta autora encontra enquadramento real na medida em que as lideranças africanas de momento são obcecadas pelo poder e para tal, todos os meios são válidos para contrariar as aspirações da maioria, usando violência que culmina em guerras civis e empobrecimento das populações.
Se os africanos querem realmente implementar a democracia que segundo CAETANO (2003, p.331-342), é uma forma de governo em que os governados são considerados titulares do poder político e o exercem directamente ou mediante representantes temporários periodicamente eleitos, onde a obediência às leis votadas são o exercício da liberdade e a mesma democracia é constitucional quando garante a renovação do pacto social entre os governantes e governados através da observância de normas que garantem o estabelecimento e funcionamento das instituições políticas democraticamente eleitas, então os países africanos têm o desafio de criar instituições que favoreçam a implementação de mudanças.
Pode-se deduzir que a democracia deve significar poder do povo, para o povo e pelo povo. Nesta perspectiva os africanos têm a responsabilidade e dever de promover uma democracia representativa, participativa e directa numa forma de governo descentralizada.
No exercício da democracia, a questão de fundo reside no conceito do poder e a respectiva manifestação entre os governantes e governados, onde se presume que seja partilhável e rotativo. Entende-se por poder político, na óptica de POMER (1994, p.4) a existência de uma capacidade da produção de resultados previamente desejados que atingem toda a sociedade num determinado sentido, com o auxílio de variados meios por parte de uma pessoa ou grupo distinto. O poder político intervêm nos processos e mecanismos que regulam as relações sociais colectivas produzindo resultados a escala macrossocial.
Na tentativa de explicar o desdobramento do poder em regimes democráticos, FERNANDES (2008, p.209) esclarece que a democracia implica assegurar a intervenção directa dos cidadãos na tomada de decisões políticas, portanto as comunidades determinam e dirigem directamente os assuntos políticos. Na impossibilidade de todos os cidadãos participarem, estabelece-se um regime representativo que se traduz na delegação de poderes a personalidades competentes que vão interpretar as aspirações da maioria.
As lideranças africanas devem perceber que só pode-se falar de uma transição democrática completa quando se observa um acordo sobre as regras para a eleição de um novo governo como resultado de eleições populares livres e justas, onde o governo de facto tem o poder de gerar novas políticas sem intervir no poder judicial e legislativo cabendo apenas ao governo do dia o poder executivo. O desacordo substancial sobre as regras básicas de acesso ao poder pode perigar a legitimidade e afectar a viabilidade do sistema político em si (MACUANE 2010,p.120).
O desafio actual é implementar democracia de facto que encontra constrangimentos devido à sacralização do poder em África onde, o conceito de alternância é ignorado. A questão cultural que se apresenta diversificada em África carrega consigo fenómeno de resistência ao modelo da democracia ocidental.
Para a compreensão dos processos eleitorais em África para legitimação do poder político, são geralmente de representação proporcional que segundo FERNANDES (2008,p.217), consiste em cada partido garantir a eleição de representantes sensivelmente possíveis à sua real importância eleitoral onde pressupõe-se que com base nas listas se permite atribuir os lugres a preencher proporcionalmente à maioria e à minoria.
A maior parte dos países africanos optam por este sistema porque favorece os partidos no poder, por sinal maioritários e com mais recursos para concorrer em todos os círculos eleitorais com as listas nacionais. Alguns estudos demonstram que os partidos no poder manipulam a lei eleitoral e a constituição periodicamente para assegurar a permanência no poder.
Criticando a fictícia legitimação do poder em alguns países africanos, POMER (1994, p.4-5), recomenda que um poder se legitima com a integração dos membros da sociedade, deve justificar as suas pretensões de poderio e dominação através de conteúdos ideais, fazer com que os seus súbditos os aceitem interiormente como uma obrigação normativa. O poder organiza a sociedade, tutela a produção e assegura a distribuição, estimula a transformação de valores.
A distribuição justa da riqueza em África engendra conflitos porque o acesso ao poder, significa vantagens pessoais, criação de redes de influência e clientelismo político e económico das elites deixando as populações na pobreza. A África de hoje tem a responsabilidade de garantir o acesso partilhado aos recursos por todos.
A distribuição desigual da riqueza tem sido o epicentro da instabilidade social em África e o grande desafio é uma distribuição mais justa de benefícios, dos rendimentos e das riquezas, pressupõe também uma mudança de atitude e comportamento das elites políticas, militares e económicas de cada país(ROQUE, 2010, p.40-41).
Para contornar estes problemas, impõe-se como desafio aos lideres africanos, a equidade de oportunidades para os seus povos, multipartidarismo assegurado pelas eleições livres e justas, liberalização da economia, liberdade de associação, incluir a mulher no processo de governação e desenvolvimento, garantir a educação e saúde incluindo serviços básicos, assegurar índices de desenvolvimento humano, garantir o funcionamento de instituições locais, desenvolvimento infra-estrutural, assegurar lei e ordem e as forças de defesa e segurança subordinadas a um controle civil (ROQUE, 2010, p.35-36).
O processo de legitimação dos vencedores em África continua um desafio na medida em que internamente os derrotados não aceitam os resultados e alegam fraudes e externamente a comunidade internacional é que homologa os vencedores segundo interesses destes. O falhanço das democracias em África nos debates actuais tem sido imputado à imposição de modelos ocidentais que em algumas realidades, conforme já foi referido em parágrafos anteriores, não encontra enquadramento cultural.
Os africanos estão criando suas próprias instituições que possam garantir a troca de experiencias da governação democrática. O importante é questionar o funcionamento dos instrumentos políticos implementados no processo da governação para o alcance dos objectivos inicialmente concebidos. Para o sucesso do mecanismo africano de revisão de pares, depende do diálogo entre a sociedade civil e o Estado e para tal sugere-se que NEPAD disponibilizasse recursos significativos à sociedade civil para efectuar a sua própria avaliação sem depender dos órgãos do Estado (CAHANGA, 2009, p.74-75).
A questão de fundo que preocupa as democracias africanas, é o tipo da sociedade civil que-se pretende. A indicação das elites com grandes interesses económicos para a sociedade civil confunde a população desfavorecida que não identifica a diferença entre o governo e a sociedade civil.
A sociedade civil em África pressupõe-se que seja forte e independente do estado e de interesses políticos para que a mesma promova a cidadania, seja um grupo de pressão, fiscalize o funcionamento das instituições democráticas observando o princípio da separação de poderes, liberdade de expressão e favoreça a discussão e resolução de problemas colectivos e prioritários que pontualmente preocupam os cidadãos ao longo da governação unitária (ROQUE, 2010, p.38).
A sociedade civil representa os interesses dos cidadãos recolhendo sensibilidades destes, cria mecanismos de canalização destas preocupações, garante a retro-alimentaçao para que os governados recebam os resultados da acção governativa e avalia de forma sistemática o sentimento dos cidadãos sobre as decisões do governo que afectem o sector público (CAHANGA, 2009,p.79).
A sociedade civil deve garantir consensos, confiança cívica no combate a pobreza e por outro lado deve motivar a inclusão de todos os segmentos da sociedade nos projectos de desenvolvimento económico sustentável para que estes tenham confiança em relação às instituições do estado. O estado deve garantir o crescimento da sociedade civil, reconhecendo o seu papel de interlocutor valido na aplicação de políticas pontuais que garantam estabilidade social e construção da nação numa visão unitária (ROQUE, 2010, p.39).
Nesta perspectiva, NGOENHA (1993 p.155 e 157), alerta que os propósitos de liberdade, justiça, igualdade, pelos quais se lutou, perdem-se pelo caminho, e os revolucionários tornam-se os usurpadores de direito, da liberdade, da participação dos próprios povos. A democracia deveria assegurar a subordinação do governo ao conjunto de direitos populares, exercidos periodicamente através dos votos. Com estas, a sociedade civil tentaria subordinar e controlar o processo decisional publico para torna-lo mais aderente às necessidades da sociedade.
Na visão de CAHANGA (2009,p.70-71), o que determina a dinâmica dos processos governativos em África é o fim das confrontações ideológicas, a transnacionalização das fronteiras políticas e económicas que-se torna uma desafio, liberalização da economia e de mercados e melhoria de relacionamento entre a sociedade e as instituições públicas. A redefinição dos modelos de desenvolvimento deve valorizar certos actores locais que antes eram excluídos da acção governativa e atribuição de papéis as comunidades locais nos processos de desenvolvimento, atribuindo-lhes responsabilidades nos momentos de decisão.
Para a compreensão dos factores que influem nas democracias africanas deve-se avaliar a natureza do regime político que pode ser presidencialista,semipresidencialista, parlamentar, monoparidário ou multipartidário; o processo da gestão de recursos políticos e económicos que pode ser centralizado ou descentralizado e a capacidade de os governos formularem e implementarem políticas de forma transparente e participativa (CAHANGA, 2009,p.78).
Sobre o mesmo assunto, apreciemos o comentário de FERNANDES (2008): Aristóteles…procurou classificar os regimes com base no número dos que exerciam o poder: todos, alguns, ou um só…chamou democracia ao regime em que o Poder é compartilhado por todos os cidadãos, que alternadamente governam e são governados (p.144).
A natureza informal e formal das instituições democráticas africanas ainda não se nota a separação entre os bens públicos, do partido e dos governantes, onde segundo BRATTON e WALLE (1997):
Presidentialism implies the systematic concentration of political power in the hands of one individual, who resists delegating all but the most trivial decision-making tasks…they consolidated power by asserting total personal control over formal political structures [and] contributed to the weakening of already frail structures within the military, the judiciary, and the civil service…(p.63).
O debate actual sugere que talvez, a África ao implementar a democracia devia inspirar-se nas instituições pré-existentes nas comunidades, olhando para a visão sócio-económico e de micro-poder que começa na família, comunidade ate à escala nacional. O poder em África é sagrado e por questão cultural não se perspectiva a alternância do poder.
As mudanças são irreversíveis, estabilidade política de qualquer sistema político é assegurada pela sua ascensão legítima através de eleições, acordos constitucionais inclusivos, lei e ordem e um órgão judicial transparente e respeitado. As instituições democráticas são a outra garantia de estabilidade política, devendo estas não se compactuarem com a corrupção e centralismo, possuírem a cultura de prestação de contas, assegurarem a implementação de políticas sociais e económicas públicas que favoreçam a todos e demonstrarem o seu cometimento de satisfazer e reflectir as aspirações prementes da população (ROQUE, 2010, p.37-38).
Sobre o mesmo assunto ROQUE (Ibid.), realça que cabe a todos respeitar as componentes da democracia caracterizadas pela tolerância e alternância política, controlo do abuso do poder, transparência e responsabilização popular, direito ao desenvolvimento, respeito às culturas, subordinação do poder governamental a uma constituição aceite por todos, a observação do princípio de separação de poderes e descentralização de poderes.
O conhecimento sobre as componentes da democracia só traz vantagens se forem observados os pré-requisitos para uma boa governação que passam pelo reforço da capacidade institucional do Estado de assegurar uma estabilidade política, a harmonia social, segurança pública, promoção de cidadania activa engajada de forma consciente no exercício de monitoria da acção governativa (CAHANGA, 2009,p.69).
Em quase todos os países africanos assiste-se periodicamente uma revisão constitucional que em parte mostra que a lei-mae, não é consensual e apenas serve aos interesses do governo do dia e da clientela política. O exercício da política torna-se uma profissão e torna-se um grande desafio mudar as mentalidades em relação ao conceito do poder em África.
A África e os seus líderes precisam empreender reformas ou mudanças radicais das suas políticas de governação, na implementação de programas de desenvolvimento económico partindo dos microprojectos até aos megaprojectos, promover abertura ao mercado internacional, combater a corrupção para que-se promova o desenvolvimento humano e satisfação das necessidades básicas da população (ROQUE, 2010, p.40-41).
A experiência mostra que nas relações económicas, planificar a partir do centro é tecnicamente inviável, não se podem obter os resultados pretendidos. A capacidade local de implementar projectos concebidos a nível central sem observar necessidades primárias dessas populações tem sido quase virtual (MAASDORP 1990, p.275).
Actualmente em África sem auscultação das bases, os líderes políticos discutem destinos dos seus povos em fóruns políticos como é o caso da NEPAD. A gestão dos projectos devia começar da base e não o contrario.
A globalização traz inovações e novas tecnologias e para o caso da África, deve investir na educação para que tenha cidadãos profissionalmente preparados para a convivência na aldeia global e controlar a eclosão de doenças providenciando os serviços básicos em saúde e outros sectores. Conforme já se referiu, a consolidação da legitimação interna do poder, a cultura de prestação de contas, e integração da mulher nos processos de desenvolvimento e de tomada de decisão contribui para a construção de Estados-nação rumo a desenvolvimento inclusivo na região que facilite a integração económica regional de cada país rumo à globalização (ROQUE, 2010, p.41).
No exemplo da SADC, no contexto de alargamento de direitos assistidos na região, a sociedade civil tem sido cada vez interventiva no processo de governação, o bloco regional faz análise dos progressos institucionais, há um esforço de se realizar periodicamente as eleições livres e justas embora para se aceitar os resultados eleitorais existem alguns constrangimentos, assiste-se maturidade política dos dirigentes e das redes da sociedade civil (CAHANGA, 2009,p.72).
As organizações regionais se afiguram via alternativa positiva para a África enfrentar os desafios impostos pela globalização. As economias regionais devem cooperar de modo a garantir o desenvolvimento sustentável e humano dos seus povos para não se tornarem dependentes de outros continentes.
No contexto da globalização, as responsabilidades de África se tornam acrescidas na medida em que deve garantir a liberdade e igualdade de oportunidades, defesa do meio ambiente, promoção acelerada da mulher, acabar com as assimetrias regionais, intensificar a cooperação internacional e aceitar a formação de governos limitados e eficazes e transparentes na gestão de interesses públicos (ROQUE, 2010, p.42).
Como desafios, conclui-se que pode-se olhar para uma África que procura desenvolver estratégias de desenvolvimento político e económico, estabelecendo parecerias como é o caso da NEPAD. Uma África que reclama boa governação, transparência, partilha do poder, alternância, multipartidarismo, liberdade e acção política e respeite os direitos humanos.
Recomenda-se também como responsabilidade dos africanos no século XXI, a inclusão do género em todos os processo de governação, redução da pobreza absoluta, promover a descentralização política, gerir conflitos, reduzir desequilíbrios regionais, garantir espaço para o funcionamento de uma sociedade civil forte e investir na investigação, saúde e outros serviços básicos. Os Estados africanos devem tirar vantagens comparativas na cooperação regional e internacional.
BRATTON, Michael e DE WALLE, Nicolas Van. Democratic Experiments in Africa.
Cambrige, 1997. Pp.61-84.
CAHANGA, Nobre. Boa Governação: Contexto, teoria, pratica e desafios para a
implementação da monitoria da acção governativa. In: SITOE, Eduardo J.(coord). Economia, Politica e Desenvolvimento. CAP/FLSC/UEM: Maputo, 2009.118p.
CAETANO, Marcello. Manual da Ciência Politica e Direito Constitucional. tomo I.
Coimbra, 2003.405p.
FERNANDES, António José. Introdução a Ciência Politica: teorias, métodos e
temáticas. Porto, 2008.269p.
MAASDORP, Gavin. O papel da economia sul africana, SACU, CMA, e outros grupos
económicos regionais. In: Zacarias, Agostinho (coord). Repensando Estratégias sobre Moçambique e África Austral. Maputo, 1990.pp.275-315.
MACUANE, José Jaime. Reforma, Contestação Eleitoral e Consolidação da
Democracia em Moçambique. In: In: SITOE, Eduardo J.(coord). Economia, Politica e Desenvolvimento. CAP/FLSC/UEM: Maputo, 2010.152p.
NGOENHA, Severino Elias. Das Independências às Liberdades. Edições Paulistas.
Maputo, 1993.183p.
POMER, Leon. O Surgimento das Nações. S. Paulo: Autual, 1994.91p.
ROQUE, Fátima Moura. África: a NEPAD e o Futuro. Texto Editores: Luanda,
2007.208p.
3 comentários:
O presente artigo nos informa bastante sobre a situação dos Países da Africa na implementação da Democracia efectiva e mais ainda e nos da algumas sugestões para que os de direito possa seguir para garantir a dignidade dos seus Povos em cada Pais.
O presente artigo nos informa bastante sobre a situação dos Países da Africa na implementação da Democracia efectiva e mais ainda e nos da algumas sugestões para que os de direito possa seguir para garantir a dignidade dos seus Povos em cada Pais.
O presente artigo nos informa bastante sobre a situação dos Países da Africa na implementação da Democracia efectiva e mais ainda e nos da algumas sugestões para que os de direito possa seguir para garantir a dignidade dos seus Povos em cada Pais.
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